ESCRITOR? O QUE É ISSO?

dezembro 15, 2011

Escritor? O Que É Isso?

 

         A maioria dos jovens que aspira à carreira literária não lê – pelo menos o que deveria. Aconselho-os a lerem um livro por cada página escrita. E, claro, cito Rilke em Carta a um Jovem Poeta, dizendo-lhes que podem ir em frente se são capazes de morrer pela poesia, ou pela literatura de modo geral. Obviamente, nestes tempos pragmáticos, as pessoas têm dificuldade de assimilar a extensão do sentido de morrer por algo. Ou, em outras palavras, o significado da entrega absoluta. Para aqueles que estiverem interessados, esse conceito de entrega total está explícito em Os Dez Mandamentos do Escritor que é completada por Os Sete Pecados Capitais do Escritor, manifestos que podem ser lidos no site http://www.davidhaize.wordpress.com. Esses manifestos, longe de serem deterministas, exaltam uma atitude de preservação da identidade do escritor acompanhada de ação permanente.

No entanto, se sempre ressalto a importância da disciplina, da persistência e do rigor, não posso deixar de admitir – sem querer ser fatalista nem místico – que um escritor já nasce escritor. Exatamente como um tenor já nasce tenor. Mas, evidentemente, o dom natural não basta. Ou seja, é necessário muito trabalho, garra e fé em si próprio para chegar aonde se pretende. Como de nada serve esforço, dedicação e perseverança se não se tem talento inato. Isso me leva a abordar a formação do escritor.

Uma faculdade de Letras não forma escritores. Uma faculdade de Letras com mestrado e doutorado, forma um técnico (por assim dizer) em literatura. Ou seja, um professor ou crítico literário. E não um escritor na acepção mais profunda da palavra. Um professor de literatura expõe o que aprendeu. Exatamente como um crítico literário. Um escritor (e por extensão qualquer artista) expõe o que cria. Quanto a esses cursos tipo “torne-se escritor”, isso é pura picaretagem. Uma coisa é técnica e outra talento. Claro, nada contra esses cursos de fim de semana. Afinal de contas acrescentam cultura.

Outro aspecto que o candidato à carreira de escritor deve levar em conta é o inefável mercado editorial. A prioridade das editoras, claro, é lucro. E elas não hesitam em publicar lixo desde que esse lixo dê lucro. Lixo que vem de fora, já promovido, rende. E lixo doméstico proveniente, por exemplo, de celebridades, também rende. Se um jogador de futebol ignorante, uma apresentadora de televisão burra, uma parceira de cama de um esportista célebre, uma vendedora de sexo famosa, ou qualquer cretino ou cretina em voga, bajulado(a) pela mídia rasteira, publicar sua biografia, é lucro garantido para a editora. E é bom frisar que isso não ocorre só no Brasil. Mas então? Como fazer para publicar um livro? Insistir – quando se tem consciência de que o livro é bom. Embora as chances sejam poucas. Ter peito para receber um não após o outro. Estar ciente de que a primeira triagem numa editora é feita por (pasmem!) estagiários. Estar ciente de que a grande maioria das editoras não só não acusa recebimento dos originais como não dá nenhuma resposta sobre a não aceitação do original. E aceitar que a maior parte das vezes a resposta – quando vem – é negativa. Desestimulante? Sim. Desesperador? Não. Resta ao escritor, como último recurso, publicar seu livro por uma das chamadas editoras alternativas, bancando a impressão. A desvantagem de publicar por essas editoras é que a divulgação é nula. Sem contar que, no caso de um bom escritor, o fato de publicar por esse tipo de editora depõe contra ele. Como assim? Bem, o leitor tende a raciocinar deste modo: se esse autor publicou por uma alternativa, é porque nenhuma editora conceituada o aceitou; logo, é porque é ruim. E não é bem assim, não. Nem tudo o que é marginal é ruim. Inúmeros grandes escritores “marginais” tiveram que bancar seus livros para depois alcançarem a consagração. Rimbaud, Lautréamont, Proust, Gide e o nosso Samuel Rawet (que teve de vender seu apartamento para financiar a edição de seus livros) são alguns exemplos entre muitos outros. Mas então, para onde se virar? Para as grandes universidades tipo USP e Unicamp? É uma alternativa. Essas universidades se relacionam com as grandes editoras. Mas é preciso fazer parte dessas instituições e, como tudo neste mundo mercenário, ter QI (quem indique como se diz popularmente). Essas instituições se fecham para aqueles que não fazem parte do meio acadêmico.

Quanto aos grandes concursos literários nacionais, funcionam como qualquer negócio. Repito: negócio. São cartas marcadas por assim dizer. Em outras palavras, salvo raras exceções, só ganha quem publica por uma grande editora ou, se não for grande, conceituada. E quem publica por uma grande editora é aquele que tem o citado QI. E quem indica é porque, de um modo ou de outro, está relacionado com o meio editorial. E mesmo assim os abutres editoriais têm que farejar lucro no original submetido para avaliação. Não existem editores no sentido genuíno da palavra. O que há são meros empresários, com cultura que deixa muito a desejar, que se dedicam a ganhar dinheiro com a publicação de livros. Em suma, homens de negócios que mexem com literatura. Ou pseudoliteratura.

Quem ainda não desistiu…

29-11-2011

R.Roldan-Roldan é escritor

www.davidhaize.wordpress.com

Publicado pelo jornal Correio Popular de Campinas no dia 6 de dezembro de 2011.