Zotão dos Divinos Bagos

novembro 1, 2016

Zotão dos Divinos Bagos

ou

Quando a Sagrada Berinjela Pulou a Cerca

 

 

 

Oh, vem com o velho Khayyam, e deixa os sábios!

Uma coisa é certa: a vida voa; uma coisa é certa,

o resto é mentira. A flor que nasce uma vez morre

para sempre.

Khayyam

 

 

Caríssimo amigo Marquis,

 

Num ataque (ou surto) de repentina veleidade literária ou, mais especificamente, cronista ou missivista, resolvi te contar como conheci meu atual amor. Algumas coisas que transcrevo não as presenciei, mas consegui costurá-las com pequenos detalhes que fui garimpando em conversas.

Como você sabe, eu era um marido fiel até conhecer a Zuzú (Zuleica), que era viúva fazia alguns anos. Mas primeiro faz-se necessário te relatar por que, sendo um marido fiel, amante de minha mulher, de minhas duas filhas e da vida familiar, pulei a cerca, como se costuma dizer. Acontece que minha esposa Lúcia, não sei se por depressão ou no fundo cansada de nossa relação, começou a frequentar uma igreja neopentecostal no intuito – acho eu – de salvar nosso casamento. Até aí, tudo bem. Respeitei sua decisão. Porém, ela queria que eu também frequentasse a igreja, mas eu me recusei. Ela insistiu. Mantive minha recusa. Mas um belo dia ela me veio com uma conversa que me deixou muito puto. Você é homem e vai entender.

– Jonas, eu queria te dizer uma coisa muito séria.

– Fala, Lúcia.

– É o seguinte, bem, não me leve a mal, mas…

– Mas o quê, Lúcia? Fala logo.

– Bem, eu gosto muito de você, meu bem. Você é      meu marido e pai de nossas filhas e…

– E daí?

– E daí que não posso mais… Por favor, não fique      bravo comigo.

– Lúcia, desembucha logo o que você tem a falar.      Não vai me dizer que você arrumou um amante.

– Credo, Jonas! Como você pode falar uma coisa       dessas! Você me ofende.

– Estou brincando, querida. Mas fala logo o que         está te incomodando.

– Jonas, meu querido marido, não vou poder fazer     mais sexo com você.

– O quê? Não estou entendendo.

– É isso mesmo. Não vou poder ter mais relações       sexuais com você.

– Você pretende ter sexo com outro homem? Você    se apaixonou por outro homem e pretende ter sexo com ele?

– Pelo amor de Deus, Jonas! Não fala assim! Você     sabe que sou uma mulher honesta, decente, fiel, que        respeita seu marido.

– Então continuo sem entender.

– Jonas, meu amado marido, nossas duas filhas já      se tornaram adultas e nós não vamos ter mais filhos.

– E daí?

– Que sexo é para procriar, senão é pecado.

– É isso o que você aprendeu na igreja?

– É o que está escrito na Bíblia.

Veio-me uma raiva súbita: minha mulher, em     questão de algumas semanas virara fundamentalista,    fanática. Deu-me vontade de gritar: enfia tua igreja    no cu porque eu vou cair fora desta casa. Mas         contive-me e disse, frio e radical:

– Você está me propondo o divórcio?

– Não, pelo amor de Deus! O casamento é indissolúvel.

– Você não espera que fique com você sem mulher,   né? Ou você acha que vou passar o resto da       minha      vida me masturbando?

E saí sem esperar resposta. Fui dar uma volta de        carro. Estava perplexo, revoltado. Sentia-me     rejeitado. Mesmo porque eu amava minha mulher. A       Lúcia me dera um banho de água gelada. Respeitei    sua decisão e não lhe pedi sexo, nem uma única vez.        Estava profundamente decepcionado. Meu casamento     ruíra depois de 25 anos. E após algumas semanas na     base do “cinco contra um”, resolvi caçar mulher.       Procurei de vários modos. Estava sempre de antena ligada, pressionado pela premente necessidade de       sexo. Afinal de contas, um homem de 51 anos não vai    ficar sublimando o sexo ou viver de fantasias     punheteiras. E acabei conhecendo a Zuzú pela    internet.

Mas eu saíra de uma relação estável com a Lúcia       e procurava uma relação séria. O que não era exatamente o que a Zuzú queria. Ela desejava um   relacionamento sem compromisso. Queria passar bem       na cama comigo e, para falar a verdade, também fora     da cama. A Zuzú é uma branca culta e gosta de curtir a arte. Passamos a ir ao cinema, ao teatro, a         musicais, a concertos e exposições. E fui-me      transformando. Não que eu seja ignorante. Como         advogado, tenho um certo grau de cultura e gosto    de ler, mas nunca fora muito ligado à arte. Isso, fora da cama. E na cama… Santo Deus! A mudança foi     radical. Zuzú é um vulcão. Tudo o que um    homem    pode querer entre quatro paredes. Passei a fazer com         ela coisas que         jamais fizera com minha mulher.        E ela me fez coisas que a Lúcia nem imagina que   possam ser feitas. E, incentivado por ela, que é boca       suja, bem escrachada na        cama, me acostumei a           falar palavrão quando metia.        A Zuzú me fazia rir na   cama. Fazia-me dar gargalhadas. Para começar,      deixou de me chamar de Jonas para me chamar de         Jotão, e, mais tarde, de Zotão – apelido que eu achava engraçado.      Isso além de uma lista de outros   nomes que não acabava         nunca, pois ela, criativa e      teatral, sempre a renovava. Atributos e definições,      que giravam em torno da minha genitália, tais como         “chourição da minha vida”, “PG, ou seja, pau     grosso”, “divinas bolas da Zuzú”, “divinas ameixas pretas da Zuzú”, “divinos bagos do Zotão”, “sagrada berinjela da minha         vida”, “santa pica de ébano da      Zuzú”, “cilindro negro do meu coração”. E quando        estávamos trepando, dizia: “fala que sou a puta       branquela do   negrão”, “fala que o negrão gosta da         boceta da        branquela”, “fala que o negrão quer irrigar         a racha da branquela”, “fala que a branquela é a      escrava do negrão e que o negrão faz com a        branquela tudo o que ele quiser na hora de meter”. E        eu, divertindo-me, repetia e ria.

Mas a Zuzú, viúva como disse, não era feliz       como       seus comentários e brincadeiras    esculachados poderiam deixar supor. Não era feliz e      não era livre. Tinha um amante fazia anos. Um         homem casado que ela amava. Mas sabe como é,    homem casado, via de   regra, não larga a mulher. Ou por conveniência, ou por falta de coragem ou por         preceitos religiosos. E ela passou a sair comigo como forma de compensar sua solidão de condição de         “a outra”, de coadjuvante que percebia que nunca        teria a chance de ser a protagonista. O amante, vira         e mexe, lhe dava o cano. E ela ficava em casa, esperando em vão. A família era      a prioridade dele.   Fosse para jantar fora, para ir ao   cinema, para visitar     amigos ou para cumprir com o dever conjugal. Uma vez ela deixou o amante esperando, ou seja, deu     cano, e quando ele lhe pediu         satisfação, ela         simplesmente respondeu que se ele tinha sua mulher,   ela podia ter outro homem. E ele teve de engolir.      Mas a relação com a Zuzú – embora    me fizesse       muito bem física e mentalmente – não me satisfazia   plenamente, não era o que eu queria. Eu almejava     uma mulher só para mim, uma relação fixa, estável.

Bem, introduzi a Zuzú para te contar como foi   que conheci, ou, melhor dito, como comecei a me relacionar com a Fina (Delfina). Aconteceu mais ou        menos assim, pelo que pude deduzir do que me foi         relatado.

F – Entre, querida. Que prazer recebê-la. Tudo bem   com você?

Z – Tudo bem, Fina. E você?

F – Tudo em ordem, Zuzú. Mas poderia estar melhor.

Z – Está te faltando algo para completar esse tudo em       ordem?

F – Está, Zuzú, está.

Z – O quê? Um homem? Você está apaixonada?

F – Acho que estou. Quer dizer, não sei. Bem…

Z – Fina, está ou não está apaixonada?

F – Querida não posso afirmar que esteja apaixonada        se mal falo com ele. Só bom dia, boa tarde e até logo.   E uns olhares significativos da parte dele. Acho que      ele é tímido. Não sei qual de nós dois é mais tímido.

Z – Fina, está esperando o quê? Dá uma dica para ele.       Algo que o faça entender. Nem sempre é o homem       que tem de dar o primeiro passo. Vai ficar com a      compadecida criando teia de aranha, sem fazer nada?

F – Ai, Zuzú, não comece com esse seu linguajar       chulo.

Z – Não falei nada demais. Disse a compadecida em vez de usar o termo boceta.

F – Credo! Que horror! Detesto essa palavra.

Z – Mas é graças à santa boceta que existe a       humanidade, ou não é?

F – Para, Zuzú. Senão não conto mais nada.

Z – Conta então. De onde você o conhece?

F – Do escritório. Ele vai frequentemente ao      escritório. É sempre muito educado e amável comigo.         Um dia ele me trouxe uma caixa de bombons.

Z – Porra, Fina! Ele já te deu sinal. Faça algo. O cara        está interessado em você. Saia com ele. Conheça-o   melhor. Não precisa disponibilizar a boceta logo no     primeiro encontro.

F – Zuzú, ou você para de falar palavrão ou eu não    conto mais nada.

Z – Tudo bem. A vagina. O que ele faz?

F – É advogado. Dr. Jonas.

Z – Negro? Bonitão? Cinquentão?

F – Sim. Você o conhece?

Z – Como o mundo é pequeno.  Sim, eu o conheço.

F – De onde?

Z – De… De alguns contatos profissionais.

F – O que você acha dele?

Z – Bonitão e muito gostoso.

F – Como você sabe que ele é gostoso?

Z – Bem… Eu… Basta olhar para ele para saber que é        gostoso. Deve ter um cacete bem grosso e um par de colhões enormes.

F – Credo, Zuzú! Como você fala! Parece mulher da vida.

Z – Ué, você não gosta de um pau bem grosso e de    duas bolas bem grandes? Negro é bem dotado de rola e de bagos. Você nunca transou com negro?

D – Eu não. Você sabe que só tive três homens na      minha vida. E todos brancos.

Z – Você não sabe como é bom um macho negro na cama.

F – Nem quero saber. Eu quero é amar e ser amada.   Não estou à procura de pênis e testículos avantajados,    sejam de negro, de branco ou de amarelo.

Z – Pois é, minha filha. É por isso que você ficou       solteirona. Você perde seu tempo. Você deixa a vida     escapar. Só se vive uma única vez. A gente tem de   agarrar a vida como ela se apresenta, sem exigir        demais. Que foi? Ficou triste pelo que falei?    Desculpa, minha amiga, não quis te magoar. Gosto        muito de você e quero que você aproveite a vida e     seja feliz.

F – Não é nada, Zuzú. Você tem razão, sou uma         boba.

Z – Você não é nenhuma boba, Fina. Você é uma       mulher inteligente e sensível. Uma cinquentona muito      bonita. Talvez um pouco à moda antiga. Diferente de       mim. Eu sou mais extrovertida, mais atirada. Mas         masculina no sentido de agir, de tomar a dianteira.    Depois que meu marido morreu, descontei o tempo       perdido e conheci biblicamente todos os homens que        quis. Nunca traí meu marido. E descobri com outros         homens, o quanto ele era comportado na cama. E       passei a gostar do sexo selvagem, como dizem. Agora     estou tendo um novo caso. Com um homem negro,        por sinal.

F – Mas e o Pedro? Você rompeu com ele?

Z – O Pedro é meu amante oficial, por assim dizer.    Mas de vez em quando preciso castigá-lo      um   pouco      para ele sentir como é dividir a pessoa     amada com     alguém. Pimenta no cu dos outros não         arde. Amo o     Pedro, mas estou cheia de ser “a   outra”. A amante,   que só recebe o que sobra de        tempo, de atenção, de compartilhamento da vida.

F – Eu entendo, querida, eu entendo.

Z – Por sinal, convidei meu… sei lá o que ele é. Digamos meu caso temporário, para vir aqui, jantar   conosco. Ele deve chegar daqui a pouco. Você não se    incomoda, né?

F – Não, minha querida, em absoluto. Será bem-        vindo.

Z – Se faltar comida, pedimos uma pizza ou comida chinesa.

F – Não se preocupe, Zuzú. Fiz bastante comida.        Preparei um couscous marroquino.

Z – Que delícia!

F – Estão chamando no interfone.

Z – Deve ser ele. O Zotão.

F – Zotão é o nome dele?

Z – Sim, Zotão das divinas ameixas. Porque tem uns formosos bagos que parecem ameixas pretas.

F – Zuzú, você não tem jeito.

Z – Os cilindros e as esferas masculinos me fizeram perder o jeito há bastante tempo. Graças a Deus,    passei a curtir intensamente as delícias da carne de macho bem apimentada. Quem se atém só ao papai-  mamãe não sabe o que está perdendo. Além do mais,     arroz e feijão todo santo dia cansa.

Subi ao apartamento. A Fina fez uma cara de     espanto   quando me viu. A Zuzú sorriu    maliciosamente e me piscou discretamente.         Abrimos uma garrafa de vinho. Passaram-se uns dez minutos. O celular da Zuzú   tocou. Ela atendeu. Falou pouco e        desligou.

– Gente, minha mãe não está passando bem. Preciso ir.    Não se preocupem comigo. Continuem com o        vinho. Ligo mais tarde.

E a Zuzú saiu. Continuamos bebendo, a Fina e   eu. Uma meia hora depois, Zuzú ligou:

– Fina, jantem vocês dois. Minha mãe está melhor,    mas não vou sair, não quero deixá-la sozinha. Um   outro dia programaremos um novo jantar para nós duas. Um beijo. Dê um beijo ao Zotão.

Jantamos. Conversamos muito. Fina é uma         mulher    adorável. Delicada, feminina, sensível,        inteligente e muito bonita. Um amor de branca, para    falar a verdade. Continuamos tomando vinho, que foi         deixando os corações e outras partes saltitantes.         Pintou um clima de sedução. A pomba-gira entrou no    apartamento. Afrodite, a safada, e os Exus        conspiraram – ou melhor, cooperaram. O mastro        começou a ficar inquieto – como animal que detecta    o odor sagrado – e ficou muito doido. E de repente,       os sinos do Zotão dobraram alegremente entre as         pernas enquanto o cilindro afundava prazerosamente         na santa caverna… E assim começou o nosso amor, quando eu menos esperava.

É só isso por enquanto.

Deu certo o novo emprego?  Espero que esteja           tudo bem com você e família.

Um abraço fraterno do Jonas.

P.S.: No próximo fim de semana estou livre. Vamos tomar uma cervejinha? Ligue-me.

 

18-09-2016